terça-feira, 27 de abril de 2010

Para Isabel Clemente, do 7X7


Meus caros, o post abaixo foi enviado para o blog Época 7X7 , que eu sigo, com atenção e prazer todos os dias. Trata-se de um comentário que fiz para o post de hoje da Isabel Clemente, jornalista de Época em Brasília, sobre as tais pulserinhas do sexo. Quem quiser conferir o post dela, é só clicar aqui http://colunas.epoca.globo.com/mulher7por7/2010/04/27/as-pulseiras-e-os-criminosos-sem-punicao/

Aqui vai o meu comentário sobre o texto dela e que acabei por decidir publicar no Blog da Lili.


Isabel, por favor, leia o relato que se segue:

"14:30. Hora do recreio numa escola pública de Belo Horizonte (MG):
Menina 1 - Oi! Olha só as pulserinhas que minha prima me deu!

Menina 2 - Eu vi... que lindo!!!

Menina 1 - É.. ta todo mundo usando... quer dizer, tudo mundo que pode, né? Essas pulserinhas são caras... as originais, porque tem um tantao falsificadas. Na televisão, naquele seriado (disse o nome) ta todo mundo usando, cê não viu?

Menina 2 - Ah... eu vi, sim! Do... (disse o nome do canal), né???

Menina 1 - É, mas aqui no Brasil também tem artista usando... só que é caro!

Menina 2 - Eu vou pedir mamãe pra comprar pra mim!
Menina 1 - Precisa não, boba! Eu te dou uma!

Menina 2 - Sério?!!!
Menina 1 - Uai... mas eu te dou uma preta, ta?
Menina 2 - Ah... me dá uma rosa?

Menina 1 - Não, rosa agora não. Só se você vier com a preta amanhã pra aula. Porque teve uma colega minha lá da sala 3 que eu dei e ela perdeu.

Menina 2 - Mas eu juro que eu não perco. Lembra que você me emprestou o lápis aquele dia, então, eu não perdi, te devolvi direitinho.... me dá a rosa???

Menina 1 - Ta bom. Eu te dou, mas ce tem que \"vim\" com ela amanhã, ta. Aí a minha prima vai ver que você ta usando e vai me dar mais e eu te dou mais uma...

Menina 2 - Beleza! As meninas lá do prédio vão ficar com inveja! Ninguém tem dessa pulserinha lá! E tem uma colega minha lá que ta doidinha querendo..."


Isabel, as pulseiras são muito reais e perigosas. Digo isso porque a "Menina 2" é minha filha de 8 anos, que foi induzida há três meses a usar uma dessas inocentes pulseiras. Graças a Deus, em casa conversamos muito todos os dias e eu nunca aceitei que meus filhos recebessem presentes de colegas ou usassem objetos de desconhecidos. Por isso, ela devolveu a pulseira, mesmo sem sabermos ainda do perigo que corria (na época eu não sabia do segredo das pulseiras). A coleguinha insistiu que usasse, mas ela devolveu. Dias mais tarde minha filha me surpreendeu com uma conversa que me deixou aterrorizada:


Minha filha - Mamãe, sabe aquela pulserinha que você me mandou devolver? Sabe o que ela significa?

Eu, toda inocente - Que quem usa tem um tremendo mau gosto? (rsrs)

Minha filha - Não, mãe! É sério... la na escola quem usa a pulserinha rosa tem de dar beijo na boca! Uma menina teve dar um beijo na boca do menino porque ela tava com a pulserinha...

Eu, caindo em mim - O quê???

Minha filha - Uai, cê não sabe não, mãe? A branca é abraço. A rosa é beijo...
E foi contando tudo, assim, como um adulto faria, nos mínimos detalhes, até chegar à pulserinha cuja cor eu nem sei dizer, e cujo significado é "sexo oral".

Isabel, tomei um susto. Minha filha de oito anos me descreveu o passo-a-passo das tais pulseiras, como se fosse um manual do Kamasutra. Fiquei sem fala. Me senti a pior das mães, uma jornalista desinformada sobre os próprios filhos. O assunto veio à tona no mesmo dia à noite, com o escândalo da menina de Londrina e depois outro e outro caso. Meninas e também meninos menores estavam usando - e abusando - do acessório aparentemente tão inocente quanto um "caiu no poço!" que brincávamos quando crianças. Só que agora a "salada mista" equivale a uma pulseira dourada, que rompida obriga o usuário a oferecer-se em sacrifício como numa orgia.

Sei que algumas pessoas acham que proibir não resolve e que isso seria uma espécie de confissão de culpa da/do menina/menino (sim, há meninos também), como se tivesse que pedir permissão para usar uma roupa ou um acessório (vide caso Geiza). Mas o que estou dizendo é que crianças não têm noção dos artifícios que adultos estão usando para atraí-las. Na hora do "pega pra capar" não são apenas adultos que entram em ação. São outras crianças e adolescentes, iguais àquelas usadas como escudo e como mulas na guerra do tráfico.

No início, a proibição do uso de mini-saias e shortinhos em escolas não foi uma simples atitude moralista, nem uma prevenção ao crime sexual. Foi uma questão relacionada à organização escolar - afinal, uniforme é uniforme. Mas querendo ou não, hoje isso vai além, porque a sexualidade, estimulada em demasia, fez com que meninos e meninas perdessem a noção dos cuidados consigo mesmos e com o outro. Cuidados que cabem aos pais e mães que deveriam dialogar, procurar saber, conversar, se informar. Eu sei disso, quem lê esse blog também sabe. Mas também sabemos que a maioria dos pais de hoje - isso se aplica em maior escala nas escolas públicas e comunidades carentes - são ainda os adolescentes de anteontem! E aí? Converse com uma mãe, como eu conversei durante anos como professora e vocês saberão.

Numa escola particular mostrada no seriado de tv, as saias curtas e as blusas amarradas na altura do umbigo são inspiração para as garotinhas inocentes fãs de grupos musicais. Mas na vida real, elas são um elogio à sensualidade precoce, quando meninas e meninos ainda não estão preparados para usar pulseirinhas de segundas e terceiras intenções. Se pais e mães têm maturidade e equilíbrio para orientar seus filhos a diferenciar a situação real da fantasia, ok. Mas... não pensamos nem fomos educados da mesma forma. Isso é real. E é isso que me preocupa muito todos os dias, quando vejo minha filha dormindo inocentemente agarrada ao seu burrico de pelúcia cor-de-rosa, enquanto la fora há gente maquinando como estuprar crianças, ou em como torturá-las (mesmo aquelas que são adotadas e deveriam ser mais bem cuidadas). Lendo o depoimento da Dra. Maria José, fico pensando se não estamos regredindo como seres humanos, a um tempo em que o infanticídio - e suas diversas formas - era uma coisa banal. E não tem sido?

A polêmica das pulseiras está aberta, mas creio que uma verdade ninguém vai negar: as pulseiras são apenas uma das muitas e muitas artimanhas das duas faces da pedofilia - a condenada publicamente e aquela que entra em nossas casas com a nossa permissão, pela antena da tv.

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