quarta-feira, 29 de julho de 2009

Sobre cobras e bicicletas


Certa vez, quando menina, encontrei no meio do mato uma casca de cobra. A pele, tosca e sem vida, jazia à beira de uma das muitas veredas que existiam naquele lugar que hoje se encontra mais nas obras de Guimarães Rosa. Eu tinha lá os meus 15 anos e pouco sabia da vida, muito menos de "cascas de cobra". Fiquei olhando aquela coisa meio bizarra e ao mesmo tempo linda, sem entender os seus porquês. Por que o animal dos mais temidos pelo homem - mais ainda pelas mulheres - se permitia a perda de algo tão vital quanto a própria pele?

Foi com essa lembrança de menina que acordei hoje, já nos meus calejados 40 anos - menos bonita e um tantinho mais esperta - pensando se não perdi tempo demais segurando a minha casca, ao invés de aceitar a inevitável mudança de pele que a vida nos impõe ou que nos presenteia (depende muito do ponto de vista).

Estou diante daqueles dilemas sobre "o que fazer agora que tenho 40 anos não tendo grana pra fazer boa parte do que eu me prometi fazer nessa idade (isso quando tinha aqueles 15). Jamais pensei que na tal idade da loba (da qual me fizeram uma propaganda danada) eu ainda tivesse de pensar em coisas do tipo "não sei se caso ou se compro uma bicicleta".
Não que eu ande querendo me casar, que pelo menos desse negócio eu já entendo. O que desaprendi é a andar de bicicleta, sabe?
Mudar de casa, de cidade, de barzinho, de profissão (quem sabe?) e de ares (talvez para os mais poluidos). Dar pedaladas por outras paisagens que não aquelas que conheço como a palma da minha mão (suponho). De repente me bate aquela sensação, como se ainda estivesse diante daquela casca de cobra, sem saber nada da vida, me perguntando "o que é isso?" ou "onde diabos andará esse bicho?".
Mudar é preciso, eu sei. Principalmente quando as coisas não vão bem. Mas ando com medo de arrancar a velha casca desses últimos 15 anos. Taí, falei. Estou com um baita medo de cair dessa bicicleta. E quem souber de algo a respeito, que me diga agora ou se cale para sempre, pois o socorro urge e a vida é breve.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

BOM HUMOR É TUDO


Acordei atrasada. Tinha compromissos às 8h30 e já eram 7h40! Corri ao banheiro para aquele banho-de-gato (se é que me entendem) e tratei de vestir a única peça de roupa limpa que ainda havia na mala depois de quase uma semana de hotel. A noite maldormida graças à insônia regada a programas de tevê de toda ordem me legara uma dor de cabeça chata - dessas que doem sem doer, sabe? Pois foi assim que fui para a sala tomar café.
Antes de sair do quarto já me irritava o som das risadas lá fora, mas a cena que vi à mesa me desarmou: lá estavam quatro mulheres às gargalhadas, parecendo um bando de rolinhas em volta da farinha de milho, aparentando um total descompromisso com a rotina dessa vida e destoando completamente da minha pressa matinal. Não sabia se passava reto ou se dizia um bom dia discreto, típico de estrangeiros. Fui pega de surpresa por um sonoro "bom dia!!!" em coro, como se euzinha pertencesse ao grupo. Pronto: foi inevitável não passar da apatia à simpatia.
Elas, visitantes meio nordestinas e meio mineiras, não se constrangiam com as piadas que faziam dos trejeitos e gafes dos próprios parentes e amigos - e o melhor: de si mesmas. Uma delas - que aparentava uns 50 anos - virou-se pra mim entre lágrimas de risos e disse "se avexe não, viu? a gente pra não rir a coisa tem de estar muito estragada mesmo. De resto, é desse jeito que você está vendo, tá?".
Imediatamente quis fazer parte da vida delas. Tive uma vontade enorme de ficar ali, desfrutando do café descomprometido e bem-humorado daquelas mulheres, que naquele determinado momento não pareciam ter diferença alguma de idade entre elas. Mesmo com a obvia aparência dos 10, 20 e 30 anos que separavam uma da outra - já que se tratava de tres gerações à mesa - ali, naquele momento, o frescor da juventude exalava e tomava conta do ambiente.
Fui para o trabalho contagiada. Meu dia - que começara com tudo para ser um ó - tinha outros ares. Tive vontade de voltar e agradecer pelo bem que me fizeram sem saber. Mas elas também saíram para tratar de suas vidas. Claro que cada uma tinha seus grilos e aflições de todos nós, mortais. Mas certamente viverão muito melhor e saberão resolvê-los com mais elegância e despojamento que muito embaixador por aí.
Sabe, definitivamente, todo ser humano desse mundo deveria ter direito a um "bom dia!!" e a um começo de manhã como aquele. Como nunca é tarde para dizer OBRIGADO, faço desse espaço meu agradecimento (que espero, um dia vejam), e dou testemunho público de que bom humor é tudo.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Meu olhar estrangeiro sobre essa tal de Democracia


Tenho quase 41 anos. Portanto, peguei uma parte considerável da "mal-ditadura". Não sei bem o que vão pensar de mim depois que lerem isso, mas preciso desafogar um nó aqui: às vezes a gente, que se comunica por tantos meios, abusa dessa tal de Democracia.

Ou será que tantos anos aprisionados nas correntes do militarismo nos deixaram "burros demais" como dizem os Titãs, a ponto de não saber usar esse utensílio tão precioso? O que me faz refletir a respeito - e não é de agora - é justamente a mania que algumas pessoas têm de fazer a crítica por simples prazer, sem acrescentar qualquer vírgula de sugestivo ao seu momentozinho intelectualidade. Isso acontece em todos os meios de comunicação, em especial no rádio, veículo que pelo simples fato de estar ligado e, dependendo da distância e do volume, coloca em nossos ouvidos - queiramos ou não - palavras nem sempre muito digeríveis.
Experimentei essa delícia de sensação outro dia no caminho de Curvelo a Diamantina, quando um passageiro empolgado tratou de presentear a si mesmo e aos demais passageiros com uma das suas pérolas do hip-hop-disco-punk-funk-pop ou seja lá o que for aquilo. Algo do tipo "chega aqui minha eguinha que eu vou por na vc na minha". E eu ali, sem poder fazer nada pra conter essa coisa que estalava nos meus tímpanos embrulhando o estômago.

O que me fez refletir foi que essa semana comparei essa aberração musical (sinto muito se alguém aí discorda) com algo que me passaram pela internet - um certo pronunciamento de um político disfarçado de dono da verdade e que insistia em chamar de "programa de rádio".

Que me perdoem os ouvintes e seguidores, mas democracia é isso aí - termos o direito de discordar ou concordar. E de fechar a janelinha, sair do blog, desligar o rádio, jogar o papel no lixo, desligar a tevê, desplugar o ipod... Ouvir/ler asneira é que não dá.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Sobre esse tal Sr. Tempo


Renato Russo já dizia que "temos nosso próprio tempo". Mas não haveremos de negar jamais a máxima "ainda somos e vivemos como os nossos pais" (salve!salve! Belchior e afins). Meu tempo está mesmo corridíssimo, me fazendo crer que 24 horas não bastam mais para o nosso santo dia.
Falando sério e dando a cara a bater, juro que eu poderia muito bem fazer melhor uso dos minutos que me dão dados "todos os dias quando acordo". Confesso, sem medo do castigo dos caros leitores, que minha ruminância de certos temas que já deveriam ter conquistado um lugar na lápide da minha memória tem sido culpada por boa parte da perda desses incontáveis minutinhos - dos quais vivo me queixando. E me queixo do quê?? De não ter mais tempo para trabalhar? De não ter mais algumas horas para gastar em frente ao pc? De não ter 25 ou 26 horas disponíveis para suprir minha fome de informação e teclados?
Uma matéria no Jornal Hoje (Rede Globo) essa semana mostrou que a maioria das pessoas consegue ficar apenas 10 minutos concentrada em suas atividades no trabalho e que pelo menos 15 minutos são "perdidos" em outras atividades consideradas "não-produtivas". Fiquei com muita pena da gente, como eu e você leitor, que trabalha tanto e no fim das contas ainda é abordado com esse negócio de "tempo perdido". Sabe de uma coisa? Estou cada dia mais convencida de que tenho perdido realmente muito tempo com coisas que daqui a alguns anos vão me trazer um baita arrependimento.
Esse blog é uma prova do quanto isso ja me traz angústia. Adoro escrever. Penso que os blogs foram a mais fantástica criação do mundo virtual e a mais importante ferramenta da internet, depois do email. O ponto alto da liberdade de expressão. E nem a ele tenho me dado o direito por conta da tal falta de tempo. No mesmo rol coloco a viagem de fim de semana com meus filhos, a visita àquela amiga no sul do país, a reunião com os colegas de faculdade que não vejo há 15 anos, os quadros que por enquanto estão sendo pintados apenas na minha mente, a volta a Milho Verde que é ali pertinho (mas parece que fica no Tibet), aquela reportagem sobre a prostituição infantil que me prometi fazer quando passei no vestibular para jornalismo (velhos tempos da PUC de BH!), a carta de agradecimento à uma amiga que enviou uma tela linda baseada no Van Gogh há alguns anos, os cuidados com minhas plantas na varanda, que já desistiram de mim e assim a lista segue...
Definitivamente, não sei cuidar do meu tempo. Vivo à base de promessas: amanhã eu ligo, amanhã eu faço, amanhã escrevo, amanhã eu bordo, semana quem vem eu pinto, no mês que vem eu teço.
Preciso aprender a encontrar esse tal de Sr. Tempo. Alguém aí se habilitar a me ensinar?
Ah... deixa eu adivinhar: estão sem tempo, né?