segunda-feira, 16 de maio de 2011

Lúcio sabia o que dizia

O livro "Crônica da Casa Assassinada" é considerado uma das obras literárias mais importantes do país. O autor, Lúcio Cardoso, nasceu em minha terrinha, Curvelo, considerada "porta do sertão mineiro", pelo grande Guimarães Rosa. Neste domingo, 15 de maio, ele foi tema de matéria interessante no Jornal mineiro Hoje em Dia. Um caro amigo e colaborador deste blog, Newton Vieira, me mandou a notícia anexa ao poema Receita de Homem, escrito por Lúcio Cardoso. O cara sabia do que estava falando. Uma receita tão boa, que a repito aqui, mas com algumas adaptações ao meu gosto. Você, fique à vontade para fazer o mesmo, com a licença poética que uma composição deste tipo permite, claro.  Portanto, eu já tenho a minha receita de homem perfeito. Alguém se habilita?

 RECEITA DE HOMEM


Depois deve ser alto,

sem lembrar o frio estilo da palmeira (mas que entenda-se por alto na horizontal, porque deve ter a medida exata do que me completa).

Moreno sem excesso para que se encontrem
tons de sol de agosto em seus cabelos. (Não recusaria jamais algo a la Denzel Washington, mesmo porque, com ele eu veria o sol até de madrugada...)

E nem louro demais para que, de repente
no olhar cintile algo da cigana pátria adormecida.
(Grisalho a la Ravier Barden não seria nada mal...)


E que tenha mãos grandes, para demorados carinhos
e adeuses que se retardem ao peso do próprio gesto.
Pés grandes, também, porque não,
para que os regressos sejam breves
e haja resistência para as conjuntas caminhadas. (Eu caminharia até o oriente médio com o ele - sem a Júlia Roberts do lado, claro).

Os olhos falem, falem sempre, falem
de amor, de ciúme, de morte ou traição.
Mas que falem. Porque o homem sem a música dos olhos
é como sepultura exposta ao Sol do meio-dia.
E que o riso relembre um pouco da infância,
para que se tenha, no fervor do beijo,
uma memória de pitanga e amora esmagadas.

(Quer sorriso mais encantador e sedutor do que esse aí?)












Ah, o corpo! Sucedam alvoradas ao longo do tórax gentil,

e escureça a penugem até o sexo velado.


(Mas não definitivamente.)



E o seu passo lembre a dança, mas com firmeza,
e o seu rastro fale de perfume, sem perfume,
e escorram pausados rios em seus flancos hieráticos.
(Dançaria pelo resto da vida se o par fosse o Banderas...)

 
E que ele cante, sem cantar,
por toda a sua humana contextura,
para que também em torno dele as coisas cantem,
quando, como o primeiro homem,
nu, ele se erguer defronte ao mar.



Canto do Rio, 3/XII/55